Não me chame pra abraçar árvore




Não me chame para abraçar árvore, eu não vou. Assim como você, eu uso energia elétrica de hidroelétrica que inunda floresta e mata bichinhos. Como tanta carne quanto qualquer brasileiro, e vamos ser sinceros, a vaquinha tem tanto cérebro e capacidade de sentir dor quanto seu poodle ou o meu Beagle. Eu uso papel de eucalipto que substitui a mata atlântica e acaba com nossa rica natureza. Eu não tenho carro, mas se pudesse teria, assim como você, e poluiria alucinadamente em prol do meu conforto e, futuramente, dos meus filhos. Eu já tive um rottweiller que comia mais que um somaliano de 30 anos. Eu voto em que eu acho certo, mas eu não lembro o nome de todos os canalhas e duvido que você lembre, porquê basicamente eles são todos assim. Em política, sou ateu. Eu não leio os projetos de lei inteiros das coisas que os memes dizem que são certas, e eu acho estranho endossar coisas que eu não conheço de verdade. Eu tenho mais o que fazer do que me inteirar de 300 iniciativas super legais por semana. 

Uso a internet para me divertir e não me sinto culpado por isso. Acho uma sacanagem que se tente manipular os meus sentimentos com fotos de animais maltratados, e igualmente absurdo e imbecil que queiram me fazer odiar alguém por ter feito algo contra eles. Não estou aqui para odiar ninguém, e qualquer tipo de disseminação negativa me deixa imediatamente apático. Cansei de mandar a Dilma fazer qualquer coisa e acho que ela não olha o Facebook. Pra mim essas mobilizações virtuais são coisa de gente preguiçosa que não quer sair do computador pra fazer alguma coisa.

Quando eu era moleque, ví os caras pintadas tirarem um presidente do governo. Quando eu tava no colégio, fui pra rua protestar contra um cara chamado ACM e fiz minha parte em sua decadência política. Com meus pés, minha voz, meu corpo inteiro. Hoje eu não faço mais coisa alguma coisa a não ser escrever o que penso, essa é uma escolha pessoal, não um compartilhamento que levou um segundo para clicar, e qualquer um pode me criticar por isso. Me incomoda essa responsabilidade compartilhada, em que niguém sabe mesmo de onde veio a opinião que está levantando. “Não me critique, quem falou isso foi Ghandi”.

Nossa sociedade é estruturalmente errada. Não é parando de tomar Coca-cola ou postando foto de árvore abraçada que isso tudo vai parar. Se jogue na engrenagem e ela vai continuar se movendo. Você vai sair repetindo os movimentos, como Chaplin em Tempos Modernos. O Facebook virou uma grande mesa de bar, onde a gente se encharca na cachaça da mudança e sai berrando o discurso dos outros, como adolescentes que acabaram de descobrir a biografia de Chê. Então tome-lhe citação bonita, palavra de ordem, e de-repente somos todos bons. A internet é uma caixa vazia e segura onde descarregamos nossas frustrações, sem perigo tocar o real. Me pergunto se não era melhor quando as pichávamos nas paredes.

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