À guisa de comentário

Para Freud a lógica é a primeira baixa do fenômeno grupal, alicerçando-se os julgamentos coletivos mais na capacidade persuasiva dos indivíduos que na validade de seus argumentos. Com muita facilidade líderes carismáticos, bem como conjuntos de membros menos dotados, juntam ao redor de si um séquito de inconsequentes. Somente quem está de fora pode perceber o entorpecimento moral a que um grupo dá lugar. Falo aqui não da horda dos linchamentos e depredações – como está em voga na Inglaterra – mas sim de comportamentos mais sutis e talvez por isso mais perniciosos. Figuras de autoridade servem de mote unificador, ao qual o grupo aquiesce em um deslocamento mal disfarçado. Impressiona a facilidade com que muitos se prestam a esse comportamento, pelo prazer liberador que ele proporciona. Eu mesmo, quando mais jovem, detestava gratuitamente a todos os meus professores. Eram pra mim o pai ou a mãe que eu precisava superar. Hoje tenho a oportunidade de estar nos dois lados, sou aluno e professor a um só tempo. É uma experiência interessante. Alguns alunos são visivelmente mais empenhados em descontruir o conhecimento apresentado, esforço muitas vezes permeado de hostilidade, que em fazê-lo dar frutos.

Já na condição de aluno observo como zoar o professor é a atividade preferida de meus colegas, e como esse elemento dá ao grupo uma coesão tão ilusória quanto instantânea. Uma vez que o ato de conhecer envolve necessariamente uma moderação dos instintos a que muito poucos estão dispostos, a figura de autoridade se torna elo de ligação para essas pessoas, que se unem para detestar aquele que lhes entrava a liberdade.

Curiosamente, após o afastamento da figura de autoridade é comum que os mesmos que o detestavam se fartem de repetir histórias sobre as manias e cacoetes dos antigos repressores, que pouco a pouco ganham lugar na economia afetiva dos ex-"cativos" em saudosas lembranças. Um processo em que a culpa e o desejo de reparação têm papel relevante.

Não falo aqui de todos os grupos, mas sim do modo como acredito se desenvolvem aqueles nos quais uma figura de autoridade não consegue para atrair a si a atenção, evitando ao mesmo tempo a parte mais hostil dos afetos negativos de um grupo.

De minha parte admito-me vitimado pelo processo, pois são justamente aqueles que mais combati os que mais vivamente permanecem em minha memória.