A Virgem





"Não vou dizer que nunca gostei da Patroa. Quando nasci ela cuidou de mim como se fosse dela. Não me chateou que ela não me deixasse entrar na casa, era assim com todo mundo. Mas com o Jorge era diferente. Desde pequena, ele me olhava de um jeito... Só fui entender quando já tava grande. Era carinho, sabe, coisa inocente. Ele sentava na cadeira de balanço e me pegava no colo até tarde na varanda. Coisa de criança mesmo. Quando levava a gente pra passear, eu era sempre a mais alegre. Ia com ele na frente, tão orgulhosa e sorridente! Sempre obedecia. Minhas amigas eram mais atrevidas, e às vezes levavam broncas terríveis! A Patroa ficava em casa no serviço, enquanto a gente acompanhava o Patrão nas caminhadas pela noite. Às vezes ele contava histórias de antigamente com minha cabecinha no colo, as estrelas lá em cima, e antes de dormir me olhava de um jeito especial achando que eu não sabia... Naquelas noites sem nuvem eu era dele e ele, só meu.

Fui crescendo e os meninos começaram a ficar atrevidos, mas por algum motivo eu não queria saber de ninguém. Eu não sabia ainda, mas meu coração era dele! Mamãe dizia que “assim vai ficar pra titia!”, mas eu não me importava. O mundo era um borrão sem graça que só se iluminava quando Ele surgia. Eu suspirava por ele, comia por ele, andava e acordava por ele como quem espera o nascer do sol. Quando eu sangrei finalmente entendi, mas tomei o cuidado de não contar pra ninguém. Se a Patroa soubesse, me botava pra correr no mesmo dia! Quem eu pensava que era, afinal de contas? Eu mal sabia falar direito, quando me aproximava as palavras me fugiam da boca! Só sabia escutar ordens, como um bicho do mato! Mesmo perto do Patrão, eu não conseguia fazer mais que balbuciar! Uma vez me aproximara pra mostrar minhas intenções, mas ele me olhara raivoso, como se estivesse envergonhado de nossos sentimentos, muito embora no fundo de seus olhos eu visse o que tentava esconder com tanto furor!

Foi só então que eu percebi que, enquanto a Patroa não desaparecesse, eu não conseguiria alcançar meus objetivos. Era Ela que me impedia de ter o homem que eu amava! Todo dia pela manhã, era Ela quem pegava o leite na porteira. De noite, quando todos estavam dormindo na casa dos empregados, fui até lá e arrumei pra que a cancela estivesse aberta de um jeito que, quando ela empurrasse, caísse direto na cabeça. Pra me certificar, batí ainda um prego que, pela posição, a furasse bem no meio dela...

Naquela noite não dormi direito, com medo de que meu plano desse errado, com medo de ser descoberta, e com ainda mais medo de que desse certo. Só dormi de manhã e acordei com o a pina sol, confusão armada, Patrão afobado e todo mundo em volta da Patroa, a cabeça amassada igual tomate podre. Não comi a manhã inteirinha, mamãe pensou que era dó da Patroa; no fundo era um pouco mesmo.

Fiquei doente, só comia do bom e do melhor, na base de leite e remédio. O Patrão ficou preocupado. “Não posso perder mais ninguém agora”, ele dizia. Me levou pra casa, me botou na cama dele. Me olhava toda noite com o terço na mão. Vinha médico, padre, rezadeira. Todo mundo ficou tão preocupado que comecei a me sentir culpada pelo que tinha feito, e mais doente também. E quanto mais doente, mais louco o Patrão ficava. Um dia eu achei que ia morrer; entre as velas do quarto eu via minha avózinha, meu vô, e até o fantasma da Patroa, com a cabeça sangrando, jurando que eu ia pagar por tudo que eu fiz! Até me arrependi, quis confessar tudo, comecei a berrar mas uma mão tapou minha boca. Os olhos do Patrão encobriam os meus e o corpo dele pesava sobre o meu. Me botou de pé e montou em mim, como os garotos faziam com as garotas da minha idade. A porta tava trancada. Lembrei do olhar do Patrão quando eu era pequena, das noites na cadeira de balanço, do céu estrelado, das histórias que só eu entendia, e de repente tudo fez sentido, todo trabalho e todo crime, tudo que eu jamais havia sonhado para minha pequena vida de repente se resumia àquele pênis vibrante de ser humano penetrando em minha virgem vagina de cabrita."

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